O governo de Minas Gerais prevê a concessão de vários benefícios fiscais, mesmo alegando problemas financeiros e após conseguir mais prazo para pagar as parcelas de uma dívida de R$ 165 bilhões com a União, em atraso desde 2018.
O que aconteceu
Entre os benefícios, estão isenções e reduções de alíquotas até 2028. Ao conceder benefícios fiscais, o governo Romeu Zema (Novo) deixa de receber ou recebe menos impostos das empresas.
Somadas, as renúncias de ICMS e de IPVA chegarão a R$ 147 bilhões em 2028. A título de comparação, esse total é próximo do valor devido atualmente pelo estado ao governo federal.
Minas Gerais conseguiu no início de agosto mais prazo para voltar a pagar as parcelas de sua dívida com a União. O ministro Nunes Marques, do STF, atendeu pedido do estado e suspendeu o pagamento pela quinta vez seguida, contrariando recomendação da AGU (Advocacia-Geral da União).
O Executivo mineiro, porém, diz que não está abrindo mão de receita. Ao conceder a vantagem a empresários, o governo atrai investimentos para o estado, diz.
No caso do ICMS, a renúncia mais que triplicou em seis anos, de R$ 4,7 bilhões em 2018 para R$ 15,4 bilhões este ano. Na Lei de Diretrizes Orçamentárias, a atual gestão prevê que o valor chegue a R$ 19,1 bilhões até 2028.
A maior parte é em crédito presumido: mais de R$ 14 bilhões. Com esse tipo de benefício, a empresa recebe um desconto e não precisa pagar ICMS sobre cada transação de compra e venda. Em seguida, vêm as reduções de base de cálculo (R$ 619 milhões) e as isenções (R$ 264 milhões).
Os benefícios com o IPVA também dispararam. Eram R$ 95 milhões em 2018 e passaram para R$ 2,5 bilhões neste ano, um aumento de 26 vezes. A previsão é chegarem a R$ 3,3 bilhões em 2028.
Para a oposição, as isenções fiscais e a dívida se cruzam, mas são assuntos diferentes. O grande problema, dizem, é a falta de clareza do Executivo para comprovar as vantagens das renúncias fiscais.
A deputa estadual Lohanna França (PV) cita como exemplo as isenções para locadoras de carros. "Não há uma comprovação do governo de que as isenções estão virando investimento para Minas", afirma.
Benefícios às locadoras de carros
As facilidades concedidas às locadoras para o pagamento do IPVA não são novidade no estado. Mas voltaram à discussão quando parlamentares estaduais fizeram uma denúncia ao Ministério Público alegando que, desde 2018, o Executivo não cobra das locadoras uma complementação quando transferem os veículos usados para revenda.
A alíquota reduzida de 1% começou há 21 anos, quando a maior locadora do país, a Localiza, voltou a emplacar em Minas, sede da empresa. Em 2017, o governo de Fernando Pimentel (PT) passou a exigir pagamento complementar, tendo como referência os 4% cobrados dos contribuintes na revenda.
O governo Zema sucedeu o do petista e não cobrou os valores que faltavam na época. Isso só começou a ser feito no fim de 2022, meses depois de o fundador da Localiza, Salim Mattar, ser nomeado consultor da gestão Zema para projetos estratégicos da Secretaria de Desenvolvimento.
A falta de cobrança gerou críticas por ter beneficiado a empresa de Mattar. Seus sócios bancaram 28% dos gastos eleitorais de Zema na campanha de 2022, como mostrou o UOL.
Quando Mattar era consultor do governo Zema, a Assembleia Legislativa aprovou projeto isentando as locadoras do pagamento complementar e mantendo a alíquota em 1%. No mês seguinte ao que ficou conhecido como "Lei Salim Mattar", o empresário deixou o posto.
No ano passado, Zema alegou que demorou cinco anos para cobrar os valores complementares das locadoras porque temia haver insegurança jurídica. No seu entendimento, disse, a cobrança era inconstitucional. A tese, porém, foi rejeitada pelo MP na época.
O secretário adjunto da Fazenda de Minas defende o benefício às locadoras. "Nós perderíamos R$ 1 bilhão por ano se tivéssemos feito isso [cobrado a complementação]. Se subíssemos a alíquota de 1% para 4%, perderíamos locadoras para São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Rio Grande do Sul".
Mais de 25% da frota do país está emplacada em Minas. Sem as locadoras e o incentivo, seria menos de 8%, Minas perderia dinheiro Luiz Claudio Fernandes Lourenço Gomes, secretário adjunto da Fazenda de Minas
Sobre os demais benefícios, que incluem o ICMS, Gomes afirma que são um incentivo para garantir investimentos. "Fizemos uma pesquisa há pouco tempo com quem investe em Minas, e o resultado foi que a parte tributária é essencial para quem investe, se não o empresário vai para outro estado", afirma.
Os benefícios podem dificultar a aprovação da entrada de Minas no Regime de Recuperação Fiscal (RRF), de acordo com o Sindicato dos Servidores da Tributação e Fiscalização. Em tramitação no Congresso, a entrada do estado no RRF é defendida pela gestão Zema, sob o argumento de que permitiria organizar as finanças estaduais com flexibilização nas regras fiscais, operações de crédito e suspensão de pagamento da dívida.
A AGU sustenta que o governo de MG deve aprovar medidas de contrapartida no Legislativo estadual para aderir o regime. Além disso, o órgão defende que as parcelas da dívida com a União sejam pagas normalmente.
A União entende como imprescindível a sinalização de comprometimento do estado de Minas Gerais com o reequilíbrio fiscal, com, no mínimo, a retomada do pagamento do seu serviço da